terça-feira, 8 de junho de 2010

Filologia do grito.

Sussuros são sempre dissimulados, frutos não da emoção que é o fenômeno criativo da lingua, mas sim da racionalização desta, acredito que os sofistas e posteriormente os estóicos só utilizassem de sussuros quando fora da ágora ou do fórum.
Grito... oriundo do latim culto "quirito" que era um elemento da retorica, é o vocábulo do trágico, plena poiesis, é a palavra romântica.
"Delenda est Cartago!" Expressão fruto da oratória pré-ciceroniana, todavia marca da mais genuína e recondita qualidade moral do velho Catão, que sobre os tribunos e senadores, gritava imperiosamente pela destruição da potencia rival, o poder de Roma foi estabelecido no grito do velho censor.
"Ahimé"! "Ahimé"! Grito classico que exprimia toda a fatalidade e profundidade da psiquê das civilizações antigas, "ahimé" é o lamento da amada com seus sofrimentos platonicos; "ahimé" também pode ser o grito dos velhos patriarcas em Timor Deus dirigindo-se à JAVÉ, Deus vingativo, nada semelhante ao nosso conhecido Ubi Caritas; Podemos dizer até que "ahimé" é o que Diógenes poderia gritar, em viceral desprezo à pólis e seus habitantes, (o que será que ele gritaria numa metrópole hodierna então?)
"Eureka"! Grito símbolo da ciência, da gênese epistêmica, das inferências intelectuais;
Arquimedes o fez com tamanho furor que esquceu seu estado de banhista desnudo, e de pronto correu Siracusa inteira, escandalizando seus habitantes com o tamanho de seu empuxo.
Newton não gritou "eureka" com a precipitação da maçã,(irônico ser este o fruto responsável pela fama de gênio, do inglês tão cristão). Ingleses são recatados por natureza, comedidos e reservados na expressão de seus sentimentos, vê-se logo a palavra "Alais", um "ahimé", desprovido de toda a intensidade dos latinos e provido com toda a frieza anglo-saxã, nem mesmo nos sonetos de Shakespeare ou nas canções tradicionais do período pré-elizabetano, "alais" teve alguma forte emoção (no entanto confesso que esta é a mais bela palavra em inglês, com uma carga poética que compensa a frieza com que é dita por seus falantes nativos).
São tantos outros gritos em tantas outras linguas e idiomas! me ocorre "Banzai", o grito da fidelidade ao imperador nipõnico; "Zieg Heil", da histeria nazi-fascista; Também cita-se "axé", termo das religiões africanas, três letras para expressar votos de felicidades, sucesso e força. Mas meu último grito, não é verbal, é um grito polissemiótico, um grito universal, é o grito de Munch. O que indica que aquela lânguida figura grita algo ao invés de apenas se espantar em silêncio? Obviamente o título é indicativo, no entanto se o título fosse outro, como o autor um dia imaginou, a obra continuaria gritando, ela grita verborragias expressionistas da época (diga-se pois, uma época muito sinistra, com filósofos como nietzsche e kierkegaard, com os expressionistas nas artes e o cientistas loucos, nas ciencias naturais).
Mais de um século depois,"o grito" de Munch ainda nos angustia, milênios depois os gritos ainda surgem em nossas gargantas, sejam eles gregos ou latinos, inglêses ou japonese, sejam eles em uma lingua inexistente ou apenas um som sem significado, nos colocamos a gritar por inúmeros motivos, alegria, raiva, amor, sendo assim posso vaticinar: O fim da humanidade ocorrerá quando esta ficar rouca.

Um comentário:

  1. André diz:
    qd tiver tempo
    leia meu ultimo texto
    o portugues ta ruim, mas a idéia é boa

    O português está ótimo; perdoo os erros de concordância, gramática e pontuação, foram trivialíssimos.
    O título é perfeito, filologia foi otimamente empregado, embora eu também possa concordar em alguma medida com a nominação de Antropologia do Grito (por motivos os quais logo explicarei).
    A estrutura está muito bem construída: a tirada final parece ter sido o motivo pelo qual o texto foi escrito, embora haja uma coerência (embora não usualmente lógica) que nos leve a um clímax bem nítido e feliz.

    Como se pode depreender da enumeração dos diversos contextos em que o grito é empregado histórica e geográficamente, ele é utilizado como ferramenta da expressão, da comunicação, mesmo como recurso da língua, de forma que constitui algo de modelável sobre uma estrutura rígida inerente à existência humana (embora não duvide de sociedades que não se utilizem de tal recurso; tendo porém a acreditar em uma tendência latente, como associo o grito ao instintivo).

    Dézão, este é por enquanto o texto pelo qual tive maior empatia, dos teus.
    Dados os limites inerentes ao autor e à possibilidade de exploração segundo seu repertório, acho que foi extraordinário o cumprimento da pretensiosíssima empreitada.
    Beijos.

    ResponderExcluir